Tradutor traduzido (entrevista com o teórico cultural Homi Bhabha) – por W.J.T. Mitchell (1995) [tradução livre]

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Homi K. Bhabha (nascido em 1949) é um teórico indiano que desenvolve estudos sobre o pós-colonial contemporâneo, hibridismo, uma série de campos do neologismo, além de construir estruturas teóricas de base. Atualmente é diretor do Mahindra Humanities Center, na Harvard University.

Tradução livre | Eder Capobianco Antimidia

Publicada originalmente na revista Artforum de março de 1995.

Em algum momento na primavera de 1984 um extraordinário ensaio chegou ao escritório da Critical Inquiry em Chicago: “Signs Taken for Wonders: Questions of Ambivalence and Authority under a Tree outside Delhi, May 1817”, submetido para uma edição especial de ensaios de Henry Louis Gates Jr. Ainda consigo lembrar a maravilhosa sensação de ler aquelas suaves e longas chapas de papéis de cebola leves como uma película, digitados com uma máquina de escrever manual. O autor, Homi Bhabha, era desconhecido por mim, e o fim do tópico – A chegada do “livro inglês” (escritura, literatura, tecnologia) numa cena de recepção colonial – repentinamente fez todo meu senso anterior de “literatura inglesa” pareceu insular e provençal, mesmo que isso tenha sido falado precisamente de uma provincial e colonial margem da cultura inglesa. Quem era esse escritor estranhamente cosmopolita, cuja prosa se movia tão facilmente de Trinidad, para o Congo e para Delhi, através de disciplinas de filosofia, história literária e teoria política? E qual pode ser o significado de seu título, juntando essas abstrações dissonantes, “ambivalência” e “autoridade”, com essa localização de espaço temporal extremamente específica, “under a Tree outside Delhi, May 1817”?

Dez anos de amizade desgastaram muito dessa estranheza, mas nada da maravilha do encontro inicial. Bhabha agora é meu colega no Departamento de Inglês da University of Chicago, e conversas de todo o tipo que se seguem, embora raramente longas, tem se tornado um frequente prazer. É difícil para mim lembrar agora o que era a vida sem elas. Mas é igualmente difícil, suspeito, para muitos intelectuais se lembrarem de como era a vida antes de termos como “multiculturalismo” e “o pós-colonial”, que se tornaram a língua franca não apenas acadêmica, mas de um discurso público internacional. Líderes de Fundações, CEOs corporativos, presidentes de universidades e líderes políticos agora espalham estas fases; elas se tornaram palavras comuns na nova transnacional ordem mundial, assim como de novos sistemas acadêmicos como os “estudos culturais”.

A escrita de Bhabha foi tão importante, suspeito, porque ele tornou difícil usar estas palavras irreflexivamente e complacentemente. Seus conceitos de ambivalência e hibridismo deixaram claro que as culturas devem ser entendidas como complexos Interstícios de múltiplos lugares, temporalidades históricas e posições do sujeito. Quando pareceu que as noções liberais de “diversidade” e homilias pós-estruturalistas sobre “diferença” poderiam prover um vocabulário final para julgar o conflito cultural, Bhabha levantou questões sobre a adequação de modelos plurais de tolerância e “civilidade” para narrar histórias de intolerância furiosa e incivilidades. Ao mesmo tempo, ele identificou os pontos cegos etnocêntricos e a retórica voluntarista no qual (na época) eram consideradas as críticas mais radicais dos modelos liberais de cultura. No presente momento, quando se ouve de todos os lados que a “teoria está morta”, e quando um novo pragmatismo e uma fetichização do “local” e “particular” parece ter paralisado a própria possibilidade de uma reflexão teórica e geral, Bhabha continua a defender a prática da teoria, a possibilidade de “tradução”, e novas formas de pensar a dialética entre o geral e o particular.

Em suma, a relação de Bhabha com os movimentos emergentes de estudos culturais, políticas de identidades e multiculturalismo tem sido qualquer coisa menos tranquilizadora. Ele disse para as pessoas exatamente o que elas não queriam ouvir, no momento em que elas não queriam ouvir, e de uma maneira que foi impossível de ignorar. Sua mensagem para o mundo da arte é provavelmente desconcertante. Essa é a época em que as “minorias” e as várias formas de autenticidade étnicas estão sendo comercializadas para consumo visual a uma taxa sem precedentes; no tempo em que a circulação global de estereótipos culturais está se tornando uma grande indústria; quando a relação da arte com o Estado, os possíveis públicos, o mercado e o posicionamento político e étnico parece ser mais volátil e imprevisível do que nunca. É improvável que Bhabha nos de uma nova forma de teoria cultural do caos para ascender acima da confusão do nosso momento. O que ele oferece são maravilhosos oásis de iluminação teórica, momentos de calma no centro da tempestade, muito parecido com a cena reflexiva de “under a tree outside Delhi, May 1817”. Chame essa entrevista, então, de “Questões de teoria, cultura e didática sobre a mesa em Chicago, outubro de 1994”.

J. T. Mitchell: Homi, você e eu temos sido amigos por muitos anos, mas deixe-me interpretar o estranho – quem é você? O que você faz? Quais fatos cruciais nos seus antecedentes você mencionaria se você estivesse se apresentando para um estranho em um avião para Calcutá, Hong Kong, Mumbai, Nova Iorque?

Homi Bhabha: Bem, se eu tivesse falando com uma pessoa de Calcutá ela imediatamente saberia certas coisas sobre mim que um vôo cheio de nova iorquinos possivelmente não. Então muito da aldeia global – também tem seus nativos.

Penso que gostaria de dizer que vivi em Mumbai nos meus anos escolares e nos primeiros anos de faculdade. Também teria que dizer que eu vim de uma pequena, relativamente pouco conhecida, minoria na Índia, os Parsis – persas que migraram para Índia no Séc. XII. Persis eram as pessoas entre as várias comunidades indianas e os britânicos. Por volta do meio do Séc. XIX eles participaram da urbanização da Índia e ajudaram no desenvolvimento comercial, mercantil e de infraestrutura profissional nas áreas metropolitanas. Eles eram chefes na indústria, médicos mongolianos e funcionários honestos.

J. T. Mitchell: Os Parsis são caracteristicamente Hindu? Muçulmanos?

Homi Bhabha: Nem um nem outro. Gosto de brincar que os Parsis são Nietzschianos porque ele seguem o profeta Zoroaster. Ele também são uma comunidade hibridizada: frequentemente seus rituais pregam respeito formal aos costumes e rituais Hindus, enquanto articulam sua própria religião e identidade étnica. Há cerca de cem mil Parsis no mundo hoje, dividido entre os continentes. Portanto sua identidade não vem de uma extensa comunidade, mas do alinhamento de ideias religiosas específicas – e isso apenas para uma pequena minoria. Os Parsis não são muito doutrinários. Entre os Parsis, ortodoxos e conservadores, há uma tendência agora de se introduzir o fundamentalismo, um retorno à pureza das raízes Parsis, mas esse movimento não vem tendo muito sucesso. Não há acesso imediato a um conjunto de textos religiosos que permeiam uma ampla cultura Parsi. Nem é uma cultura apoiada pela autenticidade de cânones culturais – o romance Parsi, música Parsi ou a arte Parsi.

Então a pergunta retorna: se a cultura Parsi não se estende por um grande número de pessoas, costuradas entre certos ícones culturais, se não é dominada por uma ortodoxia religiosa lealmente no comando, então o que significa ser um Parsi? Eu não acho que essa questão pode ser facilmente respondida. E o que é importante nas minhas origens para algumas questões teóricas que estou envolvido é que as questões repitam o próprio termo: para os Persis, como para qualquer minoria, a questão da identidade tem sido negociada e realizada no contexto da transição cultural. O emburguesamento de largos setores da comunidade Parsi não pode ser visto como minimizador desse complexo e difícil processo de identificação. Ser relativamente abastado como uma minoria não é estar livre da ânsia cultural.

J. T. Mitchell: Se alguém dissesse, acumular reservas suficiente pode ser uma caracterização rápida da identidade Parsi?

Homi Bhabha: Não acho que acumular reservas seja pensar que a questão do que significa ser Parsi é uma questão aberta; mas supondo que alguém dissesse isso, eu diria que comumente os Parsis se juntam a mesa de jantar. Nossa culinária é importante para nós – como você sabe pelas horas que passo na minha cozinha. Certos tipos de ideias seculares, e liberais, de honra, civilidade, especialidades profissionais, integridade profissional – essas também são ideias importantes de comunidade. Então muitos Parsis afirmam suas ideias de solidariedade nos dias festivos e feriados, comparecendo em esplêndidas peças teatrais, que frequentemente são partes de certos tipos de peças da Broadway, ou teatro britânico, com costumes e brincadeiras Parsi. Sempre costumava me divertir em dias festivos, os Hindus iriam para o templo e então, talvez, para edificar estes dramas religiosos, enquanto nós visitaremos o templo do fogo eles celebravam irônicas ou satíricas representações de nós mesmos, naquele tipo de imitação da Broadway.

J. T. Mitchell: Você não deixou de fora um elemento crucial? Para ser um Parsi você não tem que ser filho de um Parsi? Sei que é atávico trazer coisas como o sangue, mas eu não poderia ser um Parsi, poderia?

Homi Bhabha: Não, não existe conversão para Parsi. Na verdade, os Parsis ortodoxos estão se referindo cada vez mais as antigas escrituras, que dizem que se alguém que se casar com qualquer um de fora da crença Parsi não pode criar seus filhos como Parsi no sentido mais completo da palavra. (Isso, por sinal, está agora sendo reivindicado por esses mesmos conservadores como o segredo pela nossa feliz existência através dos séculos na Índia – que nós nunca buscamos conversos.) Então isso está sendo configurado como um tipo de princípio ortodoxo na vida das minorias, que você mantém sua separação retornando aos antigos costumes e códigos.

J. T. Mitchell: Deixe-me entrar no seu trabalho, especialmente no seu recente livro O local da cultura. Acho que é justo dizer que em alguns espaços o livro tem sido controverso; tenho escutado ele ser caracterizado como difícil, como político, como não suficientemente político, e, minha caracterização favorita, como um perigo ao pensamento científico. Qual foi a acusação mais dura a sua escrita, e como você responderia? Quais críticas você guarda no coração?

Homi Bhabha: Acredito que a questão da acessibilidade é muito séria. Que um livro pode ser prejudicado pela falta de clareza, então as pessoas não podem responder a ele, meditar sobre ele e usá-lo, é uma grande acusação a qualquer um que quer fazer um trabalho sério. Mas eu também sinto que as partes mais difíceis do meu trabalho são os muitos casos de lugares onde eu estou tentando pensar mais, e de forma futurista – não sempre, tenho medo, pode haver muitos exemplos de falhas estilísticas simples, mas geralmente eu acho que as passagens que se mostram mais difíceis para mim são os lugares onde estou tentando lutar uma batalha comigo mesmo. Esse momento de obscuridade contém, de alguma forma enigmática, o limite do que pensei, o horizonte que ainda não foi alcançado, mas traz consigo um movimento emergente de um conceito que deve ser pontuado, mesmo que isso não possa ser elegantemente, ou adequadamente, realizado.

J. T. Mitchell: Alguma passagem específica vem a mente?

Homi Bhabha: [risadas] Tentei clarear O local da cultura antes de enviá-lo para impressão, mas talvez há momentos no ensaio “Articulando o arcaico”…Ali eu estava me aventurando a descrever a maneira como a articulação das diferenças culturais lidam com o que não pode ser traduzido; o que pode ser incomensurável no momento da diferença cultural emerge na língua como uma evacuação do próprio registro significativo e simbólico que é exigido, em outro momento, para sua representação. É uma espécie de distúrbio enunciativo que lança a interpretação ou identificação em fluxo – o que, por essa razão, torna a necessidade de identificar, interpretar, historicizar, todas muito intensas. Enquanto eu estava trabalhando nesse conceito houve momento onde senti que havia alguma coisa que tinha que dizer, alguma coisa que sairia da minha boca sem palavras, alguma coisa que minhas mão poderiam esboçar no ar, ainda assim algo que eu não conseguiria agarrar. Mas eu tentei.

J. T. Mitchell: Existem momentos onde você sentiria a necessidade de agitar as mãos ao ler o texto?

Homi Bhabha: Eu espero que tenha que fazer poucos gestos agora, mas vamos olhar a página 132*:

“A cisão constitui uma intrincada estratégia de defesa e diferenciação no discurso colonial. Duas atitudes contraditórias e independentes habitam o mesmo lugar; uma leva em conta a realidade, a outra está sob a influência de instintos que distanciam o ego da realidade. Isto resulta na produção da crença múltipla e contraditória. O momento enunciatório de crença múltipla é tanto uma defesa contra a ansiedade da diferença como ele mesmo produtor de diferenciações. A cisão é então uma forma de incerteza e ansiedade enunciatórias e intelectuais que derivam do fato de que a recusa não é um mero princípio de negação ou elisão; ela é uma estratégia para a articulação de afirmações contraditórias e coevas da crença. E a partir desse espaço enunciatório, onde o trabalho da significação esvazia o ato do significado ao articular uma resposta-cindida – “O-bum”, “horário correto em duas longitudes” – que meus textos de nonsense colonial e aporia imperial tern de negociar sua autoridade discursiva.”*

* BHABHA, Homi. O local da cultura. Trad. ÁVILA, Myriam; REIS, Eliana Lourenço

de Lima; GONÇALVES, Gláucia Renete. 4ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007. (Pág. 189)

Então, você sabe que algo foi significado, mas o ato de significação comunicativa ou dialógica foi anulado, e esse vazio é uma anulação, um desacato que é uma base de conhecimento; não é meramente repressão ou evasão. Você tem que olhar para o significado desse desacato – você tem que descobrir o gesto cultural.

J. T. Mitchell: Minha associação imediata aqui é com o que George Orwell descreveu como “duplipensar” no 1984, onde ele apresenta um membro do partido como alguém que tem que dominar algo como sua “cisão” da ordem vigente para ter seu papel numa sociedade de opressão total.

Homi Bhabha: Em ambos, no duplipensar de Orwell e na minha “cisão”, o esforço deve ser feito para se viver no limiar, lidar com duas coisas contraditórias ao mesmo tempo, sem transcender ou reprimir essa contradição. O duplipensar de Orwell, porém, é um tipo de má fé. Não estou falando disso. Estou dizendo que há certos regimes de sentido, discurso, governabilidade e política que funcionam dentro, e através, das relações sociais ambivalentes criadas no ato social e discursivo da cisão, e que os sujeitos desses regimes vivem e funcionam através desse problemático processo de identificação. Essa é uma das condições determinantes de seus imaginários sociais.

J. T. Mitchell: Então, enquanto o duplipensar de Orwell é uma estratégia disciplinar política articulada conscientemente que batucava nas cabeças dos sujeitos, você está falando sobre alguma coisa mais como uma estratégia de enfrentamento, talvez até uma estratégia de resistência, ou de gerenciamento diário.

Homi Bhabha: Absolutamente. Meu ponto aqui, sobre um tipo particular de sujeito que é construído no ponto da cisão, é parte de um ponto mais amplo de construção da autoridade. Em situações onde as diferenças culturais – raça, sexualidade, localização de classe, especificação geográfica ou geopolítica – são os elementos decisivos de uma estratégia ou decreto de política particular, até o opressor está sendo constituído através de uma cisão. A cisão não cai no mesmo ponto no colonizado e no colonizador, não tem o mesmo peso político ou constituí o mesmo efeito, mas ambos estão lidando com esse processo. Na verdade, isso permite ao nativo, ou subalterno, ou colonizado a estratégia de tentar desarticular a voz de autoridade nesse ponto da cisão. Então eu não estou usando a ideia de “duplipensar” com o sentido de acusação moral de Orwell. Para mim, é muito mais a ideia de sobreviver / sobrevivência em um sentido forte – lidando ou vivendo com e através da contradição e depois usar este processo como agente social.

J. T. Mitchell: Isso, presumo, é o que sua frase “civilidade dissimulada” quer chegar, e onde se sente a conexão com as observações que Henry Louis Gates, por exemplo, fez “significando” o negro como um tipo de cisão da linguagem de autoridade, e retornando essa linguagem em um Estado ligeiramente alterado.

Homi Bhabha: Sim, em um Estado alterado – o que, todavia, frequentemente destrói os cálculos de empoderamento, e permite que os desempoderados calculem as estratégias pelas quais são oprimidos, e usem esse conhecimento estruturando a resistência. Sempre acreditei que “pequenas diferenças”, alterações leves e deslocamentos, são frequentemente elementos mais significantes em um processo de subversão ou transformação.

J. T. Mitchell: Ideias como essa são o porque eu penso que seus escritos falam não apenos do, ou para, o subalterno ou colonizado, mas também para, e sobre, aqueles que são ao menos rotulado como se identificando com a voz de autoridade, ou como pertencendo a esse lado, que como você muitas vezes aponta não é homogêneo também.

Homi Bhabha: Absolutamente. Eu sempre senti que enquanto tentava elaborar uma teoria de resistência à autoridade, e a subversão da hegemonia em certos fundamentos coloniais e pós-colonial, eu também estava abordando problemas relativos a outros momentos e localidades de autoridade.

J. T. Mitchell: Isso explica porque alguém como eu, que pensa em si mesmo como um tipo de classe trabalhadora deslocada, ou pequeno burguês intelectual homem branco, sente que seu trabalho esta, de muitas formas, falando para, e sobre, mim – não sobre alguma coisa em outro lugar.

Homi Bhabha: Estou encantado com essa resposta. Essa tem sido a minha postura agora que histórias de colonialismo, escravidão, trabalho forçado, gênero, opressão e estratificação de classe – ufa…para citar apenas alguns! – falam não apenas de classes específicas, ou pessoas, ou regiões, para qual estão muito obviamente ligados, mas mais generalizadamente das diferenças sociais que constituem a modernidade – do cotidiano da modernidade. Discursos coloniais, pós-coloniais ou de minorias, descreva como quiser, nos ajudam a pensar sobre as formas com que as hierarquias tem se articulado e negociado dentro da modernidade. Vou contra a citação da análise do discurso colonial como uma forma de “pós-modernismo”; estou mais interessado em repensar as genealogias da modernidade “contra a corrente”. Como perguntei em O local da cultura, o que era a modernidade para aqueles que faziam parte de sua instrumentalidade ou governança, mas, por razão de raça, gênero ou status econômico, eram excluídas de suas normas de racionalidade, ou suas receitas de progresso? Que discursos concorrentes ou rivais de emancipação ou igualdade, que formas de identidade e agências surgem dos “descontentes” da modernidade?

J. T. Mitchell: Quero abordar essa ideia de generalidade conceitual, no sentido de que seu trabalho não é meramente um inventário de situações locais, mas uma tentativa de deixar claro uma imagem da dinâmica de autoridade e sujeição – uma imagem que pode viajar, que pode se mover de uma situação para outra. Em outras palavras, você esta tentando fazer o trabalho que chamamos de “teoria” – talvez num sentido fraco, talvez num sentido forte; é isso que quero saber. O que você pensa que é uma teoria? Você quer que suas teorias sejam “forte”, isto é, gerar métodos, conduzir dedutivamente à certas conclusões, prover um programa de pesquisa? Ou você pensa em teoria no mesmo sentido “fraco”, como um tipo de momento de especulação dentro da prática, um momento de reflexão? Você está satisfeito em gerar algumas intuições, algumas ideias, alguns vislumbres, ou você espera mais do que isso?

Homi Bhabha: Meu desejo absolutamente não é de efeito dogmático ou dedutível. Este tipo de teorização é muito mecanicista, hermética também, só poderia produzir epígonos e intradisciplinista. Gosto da desobediência e transdisciplinaridade. A partir desse ponto de vista, o que é importante para o trabalho teórico é que deveria ser, no sentido mais completo, aberto à tradução. Uso a palavra “tradução” aqui porque, claramente, se nós estamos falando de algum tipo de atribuição, e algum tipo de linhagem, entre a teoria e sua elaboração, então não há vantagem em fingir que um corpo particular de pensamento não tem uma prioridade; precisa haver um texto para ser traduzido. Pode ser uma prioridade que está no limiar ou se deslocada internamente. mas existe alguma coisa lá que confere um determinado tipo de autorização ou autenticação. Dito isto, no entanto o que eu estava tentando elaborar todo tempo eram formas de teorização que, de certo modo, bordam a noção de ambivalência, e ambivalência é uma categoria que não pode ser fixada em um tipo de relação estrutural hermética ou iminência funcional. No entanto, ele ainda precisa produzir um conjunto de conceitos, procedimentos e estratégias que alguém vai estar apto para levar há qualquer lugar.

Isso nos traz de volta à o que a ambição da teoria pode ser – o que a teoria deseja. Isso é difícil de responder, mas penso que a teoria pode ir além da iluminação de estruturas profundas para um evento, objeto, ou texto, deve fazer mais que estabelecer, ou enfeitar, o discurso de enquadramento dentro do qual o objeto de análise é colocado. O que a teoria faz, antes de tudo, é responder uma pergunta. Você procura o que não pode usar – você procura as explicações que você tem para algo e sente que não são traduzíveis, que elas não iluminam adequadamente alguma coisa sobre outra forma de pensamento, ou o evento de um pensamento. Então você se mexeu para começar a repensar.

J. T. Mitchell: Então, a teoria é alguma coisa que emerge em face a um problema, e ela deve ser traduzível. Deixe-me dar de volta uma imagem dessa teoria. Parece com um estrutura narrativa. Teoria, em resumo, seria um ato de relocação ou deslocação sensível a um momento de admiração, de ansiedade ou de perigo. Você deve se mudar para alguma posição para narrativizar.

Homi Bhabha: Você deve-se colocar em outro lugar, ou ser colocado em outro espaço ou tempo para revisar ou rever o problema. Essa ideia de que os teóricos sentam e pensam em princípios primordiais em um estado de tranquilidade, e depois constroem um tipo de modelo, eu simplesmente não concordo com isso. Penso que você vem aos pouco, em choque. O ato de teorizar surge de um grande esforço com uma certa descrição de certas condições, uma descrição que você herda, e do sentimento exposto que você tem que propor para outra construção daquelas condições, para poder imaginar momentos “emergentes” de identificação cultural ou enunciação cultural.

O desejo por teoria, e talvez o desejo da teoria, é uma condução para se envolver com essas “condições de emergência”, na frase de Foucault – uma frase que eu poderia traduzir como “termos de generalização”. Quero dizer naquele ponto em que um evento, objeto ou ideologia procura autorizar-se – para vir a ser um discurso representativo, um discurso geral. Ele alcança esse status de empoderamento, ou super poder, não apenas através da coerência de seu próprio paradigma replicado ou mediado em outros terrenos ou situações. O trabalho de regulação, apropriação ou autorização requer outro tipo de risco, um processo mimético indeterminado pelo qual o discurso de autoridade tem que “projetar” esse paradigma em campos adjacentes e antagônicos de significados e eventos.

Esse ato de projeção – que é ao mesmo tempo uma intervenção e uma tentativa de iniciar e institucionalizar alguma coisa “extra-territorial” – exige que os limites dos paradigmas de autorização sejam eles próprios violado ou deslocados à medida que negociam o status de generalidade. Existe a violação causada por um resistência do local, ou específicas, uma vez que são articuladas dentro de um discurso generalizante; e existe o paradigma violado do discurso da própria autoridade, pois esse discurso ganha sua ascensão apenas através de conflitos locais que acontecem em seu limite discursivo e ameaçam seu fechamento. A teoria deve, portanto, intervir no agonismo entre o local e o geral, o empírico e o conceitual, a instância e a instituição, em uma estratégia de realinhamento, ou rearticulação, que pode negociar polarizações sem aderir a suas reivindicações fundamentais, ou ser presa dentro de suas representações binárias. Ela deve funcionar no ponto no qual há uma infração dos limites discursivos, ou o as delimitações de um evento. O teórico intervém no próprio movimento de deslocamento que demarca, e interroga, o que significa estar dentro ou fora do campo discursivo. Por questionar os termos da generalidade como eles tentam, através de um processo de disseminação, se incorporar, pode-se dizer que alguma força que a teoria não tem prioridade sobre a experiência, e que a experiência não tem autoridade sobre a teoria. Seus relacionamentos são traduzidos.

J. T. Mitchell: No lugar de uma generalização absoluta, o termo “tradução” volta novamente. Você está dizendo alguma coisa como, A condição do teórico é saber, no mínimo, duas línguas.

Homi Bhabha: Ou conhecer línguas duplas, para dobrar a sensação de generalidade. Há mais um passo para discutir, penso. Nossa noção sobre os usos e abusos da generalidade, ou universalidade, são frequentemente baseadas em algum tipo de pensamento binário; teoria / especificidade, generalidade / particularidade, universalidade / historicidade, condicionalidade / contexto. Frequentemente isso é um jogo de tênis. No O local da cultura eu tentei fugir desse modelo, para sugerir que talvez haja formas de pensamento sobre o geral como uma forma de condicionalidade contingente, ou como uma articulação do “intersticial” que se mantêm unidas e “vem entre” – não apenas no sentido de ser um espaço ou modo de passagem, mas no sentido coloquial de “vindo entre”, isso é, intrometendo, interferindo, interrompendo e interpolando: possibilitando e criando polêmicas, de uma vez só. Pode haver uma forma de pensar a generalidade que não de maneira binária e memética, mas através da interação. Talvez a condição da generalidade possa ser estabelecida através da repetição e do deslocamento, como Judith Butler sugeriu em seu bom trabalho realizado como agente social.

J. T. Mitchell: Você e eu falamos sobre uma apropriação de seu trabalho para descobrir uma presença geral de ambivalência. Nós temos ambivalência na Cidade do México, há ambivalência em Porto Rico; há ambivalência em Hong Kong….Considero que é uma versão da teoria que você está se preocupando.

Homi Bhabha: Exatamente. Esta versão didática parece para mim estar preocupada em transmitir uma noção de generalidade sem traduzi-la. O que é interessante sobre a interação é que ela apresenta aquele momento inquietante onde alguma coisa pode parecer igual, mas em sua enunciação, no momento de sua instanciação, no que o torna específico, revela essa diferença do igual. Você não é, como no discurso geral de generalização, apresentado ao primeiro princípio toda vez; o primeiro princípio é sempre o espaço secundário. Essa pode ser uma maneira diferente de pensar através da noção de precedentes e preceitos.  

J. T. Mitchell: Um gesto característico na sua escrita é declarar o caráter não dialógico de seu pensamento. Você parece cauteloso com as formas de pensamento Hegelianas. Como você reconcilia essa instância com uma mobilização de conceitos binários como sujeito e objeto, o eu e o outro, e noções de duplicação, contradição, cisão e, é claro, ambivalência? São oposições binárias e combinações conceituais de coisas que você não pode nem viver sem? Você está procurando uma dialética não Hegeliana sem transcendência? Se sim, você não encontra precedentes para isso dentro da própria tradição dialética, em Theodor Adorno e Walter Benjamin?

Homi Bhabha: Esta vai ser uma resposta simples: sim. Eu estou procurando por uma forma de dialética sem transcendência, como você colocou. Mas você também está certo quando diz que existe certa estrutura dialética, certos conceitos combinados, que você não pode viver nem dentro e nem fora. Escrever contra Hegel exige que você “trabalhe através” de Hegel para outros conceitos “suplementares” de pensamentos dialéticos. Você não supera ou ignora Hegel apenas porque você contesta o processo de sublimação. A lição aqui, na minha opinião, é aprender a conceituar “contradição”, ou dialética, como aquele estado de ser ou pensar que não é “nem um, nem outro, mas alguma coisa além, Abseits”, como descrevi em O local da cultura.

É aqui que a influência de Walter Benjamin foi formativa para mim. Suas meditações sobre as temporalidades disjuntivas do “evento” histórico são bastante indispensáveis para pensar os problemas culturais da modernidade. Sua visão do Anjo da História assombra meu trabalho enquanto tentamos compreender, para fins de análise cultural, o que ele descreve como condição de tradução: os “contínuos de transformação, não ideias abstratas de identificação ou similaridade”. Seu trabalho me levou a especular sobre movimentos temporais diferenciais dentro do processo de pensamento dialético e a “condicionalidade” suplementar ou intersticial que se abre ao lado da tendência transcendental de contradição dialética – chamo isso de “terceiro espaço”, ou “atraso”. Para pensar nessas temporalidades no contexto de eventos históricos fui levado a explorar noções de causalidade que não expressam a contradição “em si”, mas são contingentemente afetadas por elas e permitem outros movimentos de resistência transnacional e para o estabelecimento de outros termos de generalidade.  

J. T. Mitchell: Você pode me dar um exemplo?

Homi Bhabha: Vou te dar dois.

J. T. Mitchell: Como estamos falando de binários!

Homi Bhabha: [risadas] Para o capítulo de O local da cultura, publicado originalmente na Critical Inquiry, “Signos tidos como milagres”, fiz algumas pesquisas de arquivos de camponeses Hindu do início do Séc. XIX no norte da Índia, abordados por “catequistas” nativos que buscavam sua conversão ao Cristianismo. Seria fácil para interpretar o diálogo que se sucedeu como uma troca entre o Cristianismo colonial muscular que queria converter e uma tradição religiosa indígena que resistiu a conversão. Dito isso, o que era mais fascinante nesse processo de contradição dialógica era que os caminhos pelos quais os camponeses tratavam desse antagonismo colonial era continuamente produzir discursos suplementares como terreno de resistência e negociação. Eles diriam, por exemplo: Ficaremos felizes em se converter tão logo você nos convença que aquelas palavras do Deus Cristão não vem das bocas de comedores de carne. As palavras são muito bonitas, mas seus sacerdotes são de uma classe não-vegetariana. Nós não podemos acreditar que alguém que come carne pode transmitir a palavra de Deus.

Agora, não há nada na lógica da dialética teológica Hindu / Cristianismo, ou no diálogo senhor / camponês, que requeira a construção desse terreno incomensurável e signo de negociação: a Bíblia vegetariana. Dê-nos a Bíblia vegetariana e nós seremos conversos. Você vê o que estou dizendo? Algo se abre como um efeito dessa dialética, algo que não está incluído dentro dela, que não pode retornar para dois princípios opostos. E uma vez que se abre, nós estamos em um espaço diferente, nós estamos fazendo diferentes presunções e mobilizando formar emergente e imprevistas da agência histórica. O que nós vemos é a tradução da demanda por conversão dentro do contragolpe subalterno resistente da Bíblia vegetariana.

J. T. Mitchell: Isso parece exigir uma nova de leitura de um famoso texto Bíblico: “Não é o que entra na boca que profana um homem; mas o que sai da boca, isso profana um homem.” De repente essa frase, que tinha sido seguramente doutrinária, ganhou um novo significado.

Homi Bhabha: Absolutamente. O que foi dado é reinscrito e transvalorizado. Assim o missionário cristão tem que realocar sua posição doutrinária. A frase que era, como você disse, doutrinária, se torna retraduzida na enunciação colonial, e abre outro terreno para negociação de autoridade, ambos simbólicos e sociais.

Meu segundo exemplo é o espaço suplementar que foi aberto na Inglaterra pelos movimentos feministas, como o Women Against Fundamentalism e o Southall Black Sisters, durante o evento de Salman Rushdie. Havia um certo tipo de bloqueio binário das cornetas entre as associações de escritores liberais e o teologístas Islâmicos. Duas noções muito diferentes de textualidade eram disputadas: se você tentar ler o Alcorão através de estratégias e narrativas, valores éticos do romance pós-modernos, ou tentar ler e seguir os romances pós-modernos nos termos da interpretação textual do Alcorão, você vai encontrar diferenças insolúveis. E essas não são diferenças que alguém pode ser persuadido ou “educado” para entender.

O que era interessante para mim, entretanto, foi a resposta do Women Against Fundamentalism. De novo, elas ocuparam um espaço suplementar, criando toda uma série de questões – a respeito da educação das mulheres, das políticas de família, das políticas de prostituição. Elas também ligaram as políticas de religião no norte da Irlanda com as formas de diferença religiosa, o evento Rushdie, estava sendo transformado numa marca de diferenças étnicas e culturais, desautorizando as outras causas do conflito político, como uma classe. Essas questões não estavam causalmente ligadas ao Rushdie, mas eram complementares – estavam em uma relação adjacente lado a lado. Ao invés de levar as contradições de Rushdie a frente, e fazendo seu projeto, de alguma forma, se resolver ou transcender, eles abriram esse terreno político produtivo ao seu lado, remontando, recontextualizando, traduzindo o evento para políticas de comunidades e instituições públicas.

J. T. Mitchell: Isso me faz lembrar de Frantz Fanon, que naquele maravilhoso ensaio “Algeria Unveiled” tenta construir uma crise como algo como uma dialética de quatro vias. Você imagina um quadrilátero no qual o homem europeu e o homem argelinos encaram um ao outro numa relação, e uma mulher europeia e uma mulher argelina encaram uma a outra em outra; e então todo tipo de eixo e relação paralela, todas as permutações dessa posição, entram em jogo. Assim, a negociação de qualquer tensão particular nesses relacionamentos nunca é binária e nunca é total, vejo agora o que você está pegando a ideia de terceiro espaço que, de certo modo, é logicamente gerada mas não diretamente causada pelo que tenha o precedido.

Homi Bhabha: Isso é muito do espírito do meu pensamento. Atualmente estou trabalhando na organização de um programa de palestras, seminários, exibições, filmes e outros eventos sobre Fanon que acontecerão no ICA, em Londres, nesta primavera e verão, e serão chamados “Trabalhando com Fanon: Políticas Contemporâneas e Reflexões Culturais”. A preocupação de Fanon com a relação entre política, psique e questões de representação continua a ressoar nos debates de identidade hoje. Ele também antecipou o pensamento contemporâneo em sua visão de cultura como uma performance de campo, e em seu foco no corpo, que é o centro de suas ideias de agência política e prática cultural. Fanon é uma figura extremamente importante para mim.

J. T. Mitchell: Outros escritores cruciais para você seriam Foucault, Lacan e Derrida, uma tríade de autoridades em O local da cultura – Penso que eles são provavelmente os três autores mais citados. Qual você pensa que foi a contribuição de cada um para você, e quais pontos particulares de pressão você achaou em cada um deles, onde você não queria mobilizar eles em nome do seu projeto, mas romper com eles, ponha isso em questão?

Homi Bhabha: Estes escritores são certamente relevantes, embora eu também queira mencionar alguns outros, nem todos teóricos: Derek Walcott, por exemplo, e proeminentemente Toni Morrison e Rushdie. O escultor Anish Kapoor também me ajudou enormemente a pensar sobre a dobra do tempo no espaço e vice-versa. Artistas e escritores antecipam e pré-figuram problemas conceituais para mim. E o trabalho de Edward Said foi, obviamente, crucial em sugerir todo um terreno transdisciplinar – como digo no meu livro, a perspectiva de Said causou o flash de reconhecimento no qual eu entendi meu próprio projeto.

Para os propósitos dessa entrevista, no entanto, vamos levar esta questão objetivamente, como uma estenografia críptica. Foucault foi atrativo para mim porque eu estava contestando noções de polarização, e noções binárias de construções do sujeito dentro do jogo de poder. Fui persuadido pela minha leitura de Foucault a repensar a própŕia natureza do poder fora dos modelos polarizados ou binários. Fiquei também impressionado com a luta de Foucault em “The Archaeology of Knowledge” para definir um lugar de criação de significado e enunciação que, de certa forma, está entre a necessidade de significado para um código sistêmico, e por outro lado, a necessidade de qualquer ato de significação para se deslocar interativamente e renovar aquele código. Foucault construiu isso em uma teoria social, e eu achei isso poderoso. Não esta totalmente acabado em “The Archaeology of Knowledge”, é de muitas maneiras filosoficamente fraco, mas é muito estimulante – um indeterminismo, ainda que uma descrição calculada e estratégica dos agentes e enunciação. Eu tentei desenvolver essa questão em O local da cultura.

Acho que onde eu me senti mais preocupado em pressionar Foucault foi sua incapacidade de olhar o outro lado de certo paradigmas da modernidade ocidental. Ele sempre estava ilustrando as forças liminares, ou excludentes, ou normalizadoras, ou individualizadoras, da modernidade ocidental, mas ele nunca tratou adequadamente com a separação entre modernidade e o que considero outros espaços, a dupla sessão ou inventário – o espaço colonial.

J. T. Mitchell: Isso seria um problema menor se Foucault não tivesse identificado seu sujeito como “o ocidente”? Se ele não tivesse visto seu livro como uma tentativa, de alguma forma, de dar uma arqueologia do conhecimento ocidental, com um espaço vazio e não identificado, oposto a isso?

Homi Bhabha: Eu não sei se essa estratégia tiraria ele do problema. Se ele nomeia isso de ocidente ou não, ele exige certas metáforas espaciais de homogeneização que não permitem as temporalidades diferenciais, rupturas de outras articulações culturais. Há algo sobre o Spazialismo lá que é problemático.

No que diz respeito a Lacan, fiquei impressionado com sua habilidade para prover um registro linguístico para o desejo afetivo e identificação. Em minha leituras de Lacan descobri que a tentativa de metáforas e metonímias dos trópicos era carregada de significados intersubjetivos e inconscientes – significados que podem ser recuperados para uma leitura dos símbolos de domínios dos textos sociais. Suponho que o que eu estava tentando fazer com Lacan era pegar sua rota do pequeno objeto “a” e submetê-lo a uma série de rotas sociais e locuções culturais. Os “objetivos” do desejo se tornaram meu tema. Eu estava tentando ver como aquela trajetória do desejo seria capaz de investir valor social em objetos particulares. Também estava interessado em tomar noções de repetição e interação no trabalho de Lacan e usá-lo para questões de tradução cultural.    

Acho que existe uma ligação do meu pensamento em torno de Lacan e Derrida, apesar de suas famosas diferenças de ponto de vista. Fiquei muito impressionado com a habilidade de Derrida para demonstrar as práticas textuais, inscritivas e institucionais de diferimento e deslocamento. Penso que a pressão que coloquei em Derrida foi para dizer que se nós aceitarmos os processo de diferimento, espacial e temporal, ainda aceito, em certo ponto, que há fechamentos contingentes, então, como repensamos essa contingência, não como algum tipo de causalidade teológica, mas como uma causalidade interativa além do apagamento da determinação estrutural ou funcional? Estava interessado em desenvolver a declaração de Derrida: “Para alguns de nós, o princípio do indeterminismo é o que torna a liberdade consciente do homem insondável.”

J. T. Mitchell: Então você queria elevar Foucault e derrubar Derrida.

Homi Bhabha: [risadas] Sim, e para desviar de Lacan.

J. T. Mitchell: Gostaria de desenvolver a questão das coordenadas políticas de seu pensamento. Com agilidade, e considerável respeito, você parece se mover entre duas tradições intelectuais que posso caracterizar vagamente como liberais e radicais, exemplificadas por emparelhamentos como John Stuart Mill e Karl Marx, Bernard Williams e Stuart Hall, e outros, poderia pensar no meu espanto pela imparcialidade com que você cita esse autores. Você poderia se divertir bastante ao custo do pobre Mill, mas você resiste, você o toma seriamente como um complexo pensador e um homem de boa vontade preso em uma circunstância complexa. Você está tentando definir alguma posição de negociação entre radicalismo e liberalismo? Como você descreveria a política de suas ideias?

Homi Bhabha: Neste momento histórico, penso, nós estamos continuamente negociando entre certas ideias liberais, ideologias e uma crítica radical delas que emerge da história do, então chamado, pensamento “materialista”. Nós estamos em um estado de tradução entre estes dois. Nós sabemos, por exemplo, das limitações das noções de direito, particularmente em áreas como raça, sexualidade, dos migrantes, refugiados. Nós sabemos que toda natureza dos direitos não será adequada para as condições de discriminação que encontramos. Ainda assim, se quisermos ser eficazes e aliviar certas situações críticas de opressão, nós temos que ativar a noção de direitos. Não podemos ignorar isso. Acho que houve um tempo onde as pessoas desconsideravam o liberalismo de uma maneira que não respeitavam suas oportunidades reais e operacionais. Havia um tipo de arrogância ingênua que sugeriu que uma vez que você desconstrua filosoficamente uma prática, você não pode reconhecer seus poderes práticos e funcionais. Então, pareceu-me que um radicalismo, um materialismo, um Marxismo, que foi elaborado sobre uma leitura fraca e polêmica, de uma complexa e rica história do liberalismo, não era um radicalismo que valia muito a pena se ligar com. Está tudo bem para polêmica, está tudo bem para rótulos, mas era realmente inadequado se pensar com, ou agir com.

Eu também fui pego uma vez ou outra pela intrusão, ou articulação, do pensamento liberal dentro do mais radical pensamento, particularmente na concepção da noção de agência. Para falar sobre agência política ou histórica, os relatos materialistas de causas estruturais sempre parecem recorrer a relatos liberais e intencionalistas de ação e identidade. Apesar de todas as conversas sobre sujeitos fragmentados, significantes flutuantes, totalidades estruturais e “espaços” pós-modernos, há um interessante retorno paradoxal as articulações tradicionais da consciência – intenção – ação quando discutir, digamos, a ética radical do compromisso. Essa noção de intencionalidade parece para mim emergir dos discursos do liberalismo. Muitas teorias materialistas ainda se baseiam na linguagem do liberalismo, mas são muito orgulhosas, ou muitos cegas, para reconhecer isso.

J. T. Mitchell: Sim, há um certo tipo de desdém, uma certa forma de pronunciar a palavra “liberal”, tanto na direita quanto na esquerda. Nos Estados Unidos, nos anos de 1980, nós assistimos a palavra “L” ser espancada pela direita, e sempre me pareceu curioso e mais curioso que naquela questão, pelo menos, a extrema esquerda e a extrema direita poderiam concordar – o liberalismo está morto.

Homi Bhabha: Penso que houve uma falta de discussão sobre o que chamo de liberalismo tardio. No trabalho de Michael Walzer e Charles Taylor, um liberal mais comunitário, o outro um liberal mais hegeliano, por exemplo, estamos vendo a necessidade contínua de pensar nos momentos de liberalismos não pensados, e é por isso que o liberalismo tardio está tão obcecado pelo multiculturalismo. Não pergunte o que o liberalismo pode fazer pelo multiculturalismo, pergunte o que o multiculturalismo está fazendo para a vida enfraquecida do liberalismo tardio! Devemos reconhecer essa característica do nosso momento histórico atual, mas nós não devemos celebrar o “não pensamento” liberal. Nossa discussão apontou para outros caminhos, tomados e não tomados, que nós devemos explorar. Aqueles de nós que criticam os pressupostos individualizadores do liberalismo devem fornecer um relato mais convincente da agência pública e do sujeito ético-político, particularmente no contexto de repensar questões da causalidade social, contingência e a questão da referencialidade na área da representação cultural.   

J. T. Mitchell: Agora que nós cuidamos das perguntas fáceis, vamos nos direcionar para noção de cultura, maravilhosamente complexa. Primeiro, me pergunto como você caracterizaria o trabalho que o conceito de cultura está fazendo na discussão crítica contemporânea. Parece ter assumido um valor incrivelmente inflacionado – em todo lugar. Na academia há um novo campo emergindo, estudos culturais. O termo “cultura” está começando a se tornar um solvente tão universal que está perdendo sua utilidade?

Homi Bhabha: Esta é uma grande questão, mas também específica, para se fazer com certas instituições de aprendizagem nesse momento. A palavra “cultura” é notória por seus limites vagos – da “cultura da queixa” à “cultura e civilização”, ou o que seja. Penso que as pessoa estão usando a palavra para marcar o fato de que na humanidade, hoje em dia, nós frequentemente nos vemos em espaços de interdisciplinaridade sombreada. A humanidade vive em um espaço transdisciplinar ou intertextual. A academia é muitas vezes organizacionalmente incapaz de tratar disso. Entre as ideias de inter ou transdisciplinaridade e sua institucionalização, caíram na sombra.

Tenho a sensação de que nos últimos trinta ou quarenta anos instituições liberais tem estado bastante confortáveis com uma versão de interdisciplinaridade – vamos chamar de “Interdisciplinaridade 1”. Essa é uma interdisciplinaridade da qual todos temos familiaridade: graus conjuntos, ensino conjunto. Supõe que diferentes disciplinas tem verdades fundamentais, mas que se você colocar dois fundamentos em proximidade, você tem um fundamento mais amplo, certo? Então, Interdisciplinaridade 1 é uma forma de inflamar, ou coroar, uma disciplina particular com ideias ou conhecimento de outra disciplina para celebrar o amplo humanismo das humanidades. Ilustrando suas teses históricas com referências a literatura, e em seguida, alinhando-as com uma perspectiva sociológica ou psicológica, molda um brilho aurático em torno do seu trabalho.

Eu acho que as instituições estão bastante confortáveis com a Interdisciplinaridade 1. Mas existe um modo diferente de interdisciplinaridade – “Interdisciplinaridade 2”, vamos dizer – em que nossa invocação de outra disciplina acontece na beira, ou no limite, da nossa própria disciplina. Não é a tentativa de fortalecer os fundamentos pelo desenho de outra; é uma reação ao fato de que nós estamos vivendo na fronteira real de nossa própria disciplina, onde algumas das ideias fundamentais da nossa disciplina estão sendo profundamente abaladas. Então nosso momento de interdisciplinaridade é um movimento de sobrevivência – a formulação de conhecimento que demanda nossa disciplina escolar e técnica, mas exige que abandonemos o domínio disciplinar e a fiscalização.

Em uma série de áreas humanistas questões a se fazer com o indeterminado, com contingência, com intertextualidade, tornaram-se centrais – a questão da ambivalência também. Isso porque Interdisciplinaridade 2 é disparada com um desejo de compreender mais completamente, e mais problematicamente, que ela é colocada no ponto fronteiriço de nossas disciplinas, e que nos obriga a articular uma nova e colaborativa definição de humanidade.

J. T. Mitchell: Encontro aqui uma ressonância da minha própria forma de interdisciplinaridade, que, como você sabe, reside em algum lugar da conjunção dos estudos literários, história da arte e estudos de mídia visual. Interdisciplinaridade 1 tende a trabalhar no que chamaria de modo comparativo, coordenando conhecimento em campo adjacentes para tentar criar uma série abrangente de descobertas. Então, você frequentemente obtém uma reciclagem das coisas que já são conhecidas: as narrativas são preenchidas com mais detalhes, mas a história permanece a mesma. Na Interdisciplinaridade 1 existem também o sentido de um tipo de opulência, ou luxúria. Considerando que o tipo de interdisciplinaridade que estou procurando, se sente imposto como necessidade: minha pergunta sobre literatura não poderia ser respondida por mim ao menos que eu tivesse pronto para perseguir o visual, independente de onde isso me leve.

Homi Bhabha: Isso traz de volta a sensação da teoria como o enfrentamento de um problema. Ele sai da luta, da ansiedade, do anjo vingador dentro de você. Não é uma arte da tranquilidade.

J. T. Mitchell: E ocorre, penso eu, quando você sente que existe alguma coisa como um buraco negro na sua disciplina que nenhuma das categorias que se estabilizaram como fundamentais pode abordar. Na verdade, todas elas foram planejadas precisamente para descartá-lo – para dizer que isso pertence a lá, está em uma base diferente, é outra parte da metropolis do conhecimento. Penso nesses arranha-céus em linhas paralelas, o grande departamento – história, literatura inglesa, história da arte, filosofia – cada um como construções de escritórios gigantes com seu piso de sub-especialidade. Mas a foto que estou procurando vai pelo encanamento, e conecta todos esses prédios em algum lugar abaixo do solo.

Homi Bhabha: [risadas] Uma metáfora fundamental! Só quero dizer uma coisa antes de abordar esse tópico, o que é que vejo na ética da interdisciplinaridade que estou envolvido, e que acho que você está envolvido também, como a sobrevivência e tradução das disciplinas em um espaço que é não simplesmente o espaço de uma disciplina ou outra, mas, de acordo com nossa discussão anterior, um terceiro, ou suplementar, espaço.

J. T. Mitchell: Alguns dos que se vêem como trabalhando no sentido de um domínio de uma disciplina se ressentem da interdisciplinaridade de qualquer tipo, e particularmente do segundo tipo. A Interdisciplinaridade 2 é tão obcecada com as margens, o ponto de indeterminação, de problemas ou anomalias não solucionados, que pode parecer muito a não disciplina, indisciplina, insubordinação. Se a Interdisciplinaridade 2 está situada no lugar onde as disciplinas parecem estar em crises, você vê isso como um caminho de preservação dos departamentos acadêmicos tradicionais na medida em que se preocupam com as disciplinas? Ou eles vão se dissolver numa enorme e nova estrutura chamada “estudos culturais”?

Homi Bhabha: Por uma série de razões, os departamentos provavelmente vão continuar como departamentos, em parte porque argumentos intelectuais não desmantelarão as instituições, em parte porque habilidade escolar e a esperteza arquivista são mais valiosas. O que temos que ver é como podemos negociar e trabalhar com esses espaços para criar novas formas de engajamento intelectual. Eu não seria a favor de um novo império dos estudos culturais. Acho que é um pensamento bastante perturbador, porque tornaria tão fácil se criar uma nova homogeneidade – uma homogeneidade além disso; que pode parecer plural, com o frisson adicional de ser por definição radical e marginal, mas pode ser, na verdade, meramente celebrativa. A tensão essencial de transdisciplinaridade seria perdida.

J. T. Mitchell: Uma das formas que o termo “cultura” vem sendo usado, constrativamente, é em relação a cultura de massa, cultura popular. Arte como cultura se coloca contra estas outras formas de cultura como uma instituição de valores, objetos de alto preço, recepção e apreciação refinada, histórias escolares. A arte, nesse sentido tradicional, desempenha um papel forte para você? Ou você vê ela como uma dissolução dentro da interdisciplinaridade e cultura em geral? O que você e eu – estudiosos “baseados em textos” escolares, por assim dizer – fazem na Artforum?

Homi Bhabha: Certamente vejo a arte confrontando o problema da interdisciplinaridade como resumimos. Você perguntou o que nós estamos fazendo na Artforum. Bem, um impulso na Interdisciplinaridade 2 foi o fato de que aqueles de nós que estiveram em escritos, baseadas em texto, começaram a ver o sinal em um contexto muito mais afetivo. Começamos a ver todos os lugares da visualidade, moralidade e afetividade na escrita – um conjunto de escritos, atributos corporais, escrita ou linguagem como parte do inconsciente, escrita como parte do adiamento temporal, escrita como parte da identificação social, escrita, retórica e narrativas como base de um julgamento ético. A natureza dos sinais foi aberta para nós. Igualmente, os envolvidos em uma cultura visual tem começado a ver o lugar do inscritivo, da sistemas e códigos de significado, no visual. A realidade espontânea do visual foi alienada. O imediatismo do prazer visual, a noção de gosto como uma teologia de uma perfectibilidade histórica ou uma forma de conhecimento aristocrático – essas questões foram colocadas em crise, significativamente pelas feministas, filmes, e teóricos de mídia. Sua própria formulação de uma “cultura visual” no seu livro Picture Theory fala eloquentemente dessa questão.

J. T. Mitchell: Você está quase descrevendo os novos estudantes de literatura como espectadores, conhecedores, empregando todos os sentido agora exceto, talvez, o qual eles começaram com – aprender a ler, decifrar, decodificar. Agora eles estão sentindo, vendo, cheirando alguma coisa palpável no texto, enquanto estudantes de arte visual estão aprendendo a ler.

Homi Bhabha: Bem, você está aqui, um exemplo do que eu estive descrevendo como o impulso da tradução da Interdisciplinaridade 2! A compreensão do “texto” e da “inscrição” como descritiva dos processos sociais, ao invés de sistemas meramente linguísticos e a atenção as políticas e prazeres do corpo – esses interesses foram compartilhados por pessoas trabalhando através das humanidades durante as últimas duas décadas, e é o discurso que construíram que permite a transferência de habilidades de leitura.

J. T. Mitchell: Mas deixe-me levá-lo de volta ao ponto inicial, que era a noção de arte como alguma coisa distinta da cultura em geral – da arte como uma prática e prazer da elite. Não importa quantas revoluções na relação da arte e cultura tenham ocorrido em nome do pós-modernismo, o fato que permanece é que as propagandas nessas páginas em torno dessa entrevista não vão ser de cigarros ou programas de televisão, mas, em sua maioria, para galerias e outros lugares onde coleções muito especiais de objetos culturais são reunidos. Isso pode soar terrivelmente retrógrado, mas a ideia de que objetos de arte podem ser valiosos, e que isso tem algo a ver com um consenso da comunidade sobre seu valor, não me incomoda particularmente. Talvez seja só o meu senso de que precisamos de objetos especiais que pessoas possam reparar, e quero dizer “reparar” em todos os sentidos da palavra. Há muitos lugares onde vejo o capitalismo ir mal, se me derem liberdade total para extinguir o mercado de arte e substituir por outra coisa, não sei se gostaria de fazer algo muito diferente. O que está errado com o mercado do seu ponto de vista?

Homi Bhabha: Estou preocupado, Tom, pelo domínio do mercado de artes voltado ao ocidente, pela forma que eles estabelecem padrões de aceitabilidade. Estou preocupado pela forma com qual o apetite voraz das exibições transnacionais e globais criaram um critério internacional de julgamento, aceitabilidade e excepcionalidade que apaga os locais onde esse trabalho é feito. Mercado de artes em outros países e continentes, certamente incluindo o terceiro mundo, são muito influenciados pelos mercados metropolitanos, suas necessidades particulares, seus valores, seu fetichismo, sua forma de consumo.

J. T. Mitchell: Sim, penso imediatamente na fortuna das pinturas aborígenes na Austrália, tanto no consumo em Nova Iorque como em Paris, onde frequentemente é percebida e consumida como uma maravilhosa abstração formalista, e na sua produção, que envolve complicadas negociações entre, por um lado, o que os anciãos tribais pensam ser adequado e interior para a prática de arte nas comunidades da Austrália, e em outra, o que é adequado para exportação.

Homi Bhabha: Esse é um bom exemplo de um caso em que as condições de trabalho e produção são, de diferentes maneiras, muito diferente das condições de sua entrada no mercado da arte. Também estou preocupado com um tipo específico de ajuste, ou de fato uma correção, que é exigida para uma apresentação. O que é canalizado é precisamente o que o mercado ocidental exige, e então todos os outros locais ficam transfixados pelo que está acontecendo no mercado Europeu e Americano. Artistas muito particulares são convidados para este espaço. Não é uma questão simples: um artista que faz exatamente o que o museu exigiu não caberia nesse espaço. Ele deve ser desobediente de alguma forma. Mas a desobediência pode ser regulada, que a distinção pode ser pré-determinada, ou supra-determinada.

J. T. Mitchell: Você acha que um processo similar contínua sobre o que às vezes é chamado de literatura do terceiro mundo?

Homi Bhabha: Ah sim. Uma série de autores do terceiro mundo tem tido tempos tão difíceis como escritores em suas próprias culturas e comunidades que existe esse lado de agonia romântica  de mim que diz, grandes sucessos podem ser comemorados, pelo tempo que eles durem, grandes sucessos podem ser fetichizados. Mas, da forma como os editores nos perseguem por um certo tipo de texto, eles claramente querem que nós que sejamos arqueologistas e etnografistas de nossas culturas, para um mercado “mundial” já definido, e penso que isso é muito problemático. Em áreas e formas de escritas novas e inovadoras há imediatamente uma pressão para se coletar novas histórias e fazer antologias, então esses escritores podem ser imediatamente rotulados, comercializados e embalados para um consumo “internacional” exagerado.

Sobre Homi K. Bhabha | https://en.wikipedia.org/wiki/Homi_K._Bhabha

Texto Original | https://prelectur.stanford.edu/lecturers/bhabha/interview.html

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